SOBRE OS LIMITES DE VELOCIDADE

José Fernandes de Lima[1]

Muitas cidades estão limitando a velocidade dos automóveis que transitam em suas vias.  Para garantir esses limites, instalam câmeras e barreiras eletrônicas que fotografam e multam implacavelmente aqueles que ousam ultrapassar a velocidade permitida. Alguns condutores reclamam, outros recorrem à justiça em pelejas que se prolongam por meses, mas as prefeituras continuam firmes na fiscalização e na aplicação das multas.

O que, em última análise, parece incomodar os motoristas é o fato de a limitação de velocidade impedir que eles cheguem mais cedo aos seus destinos. Reclamam que o poder público está atrasando suas vidas. Os defensores da limitação de velocidade, por outro lado, rebatem as críticas dizendo que os referidos motoristas devem garantir a pontualidade saindo de casa alguns minutos mais cedo.

A conveniência da limitação da velocidade ainda é um assunto controverso e, como tal, deve continuar a ser debatido. 

Nesse artigo, vamos tratar de uma particularidade que parece não fazer parte da preocupação das pessoas quando a discussão sobre o limite de velocidade nas ruas ou estradas é feita.

Refiro-me à pergunta: Qual o ganho real de tempo proporcionado por um determinado aumento da velocidade? 

Será que aumentando a velocidade em 50% consegue-se uma redução do tempo de viagem de 50%? Suponha o leitor que um motorista deseja diminuir 50% do tempo que leva de casa até o trabalho. A permissão para aumentar de 50% a velocidade média que costuma desenvolver resolve o seu problema?

A resposta para as duas últimas perguntas é a mesma: não.

Se valesse o tipo de raciocínio acima, se os valores fossem complementares, teríamos que um aumento de 100% na velocidade resultaria em uma diminuição de 100% do tempo de deslocamento, ou seja, a viagem demoraria zero minutos, ou melhor, o deslocamento seria instantâneo.

Para melhor entendermos essa situação, tomemos como exemplo uma viagem entre as cidades de Aracaju e Poço Redondo que distam aproximadamente 180 quilômetros.

Desenvolvendo uma média de 60 km/h, o condutor vencerá o percurso em 3 horas. Se aumentar a velocidade média em 50%, ou seja, se viajar com uma velocidade média de 90 km/h, o percurso será feito em 2 horas.  O tempo de viagem diminuirá de 3 horas para 2 horas, o que significa uma redução de 33,3% do tempo.

Logo, um aumento de 50% da velocidade diminuiu o tempo da viagem de apenas 33,3% e não de 50% como algumas pessoas poderiam esperar. E se o aumento de velocidade fosse de 100%?

Voltando para o mesmo exemplo, corresponderia a fazer a viagem com uma velocidade média de 120 km/h, o que significa que levaríamos 1 hora e meia para chegar ao destino. Aumentando a velocidade de 100%, reduziríamos o tempo pela metade, ou seja, em 50%.

Os cálculos acima foram feitos considerando um único valor de velocidade para todo o percurso, mas o exercício pode ficar mais interessante se admitirmos que, em função das condições da estrada e do trânsito, o caminho pode ser percorrido com velocidades variadas em diferentes trechos da estrada.

Se o leitor brincar com algumas dessas simulações, dividindo o trajeto em dois, três ou quatro trechos e depois quiser calcular o tempo médio da viagem a partir dos tempos médios transcorridos em cada trecho específico, constatará que a fórmula necessária para o cálculo da média final será diferente daquela fórmula tradicional usada para o cálculo da média aritmética que costumamos utilizar. 

O leitor será levado a utilizar outro tipo de média que costumamos chamar de média harmônica que é dada pelo inverso da média dos inversos. Dito de outra forma: é igual ao número de elementos do conjunto dividido pela soma dos inversos dos elementos. 

Um caro percorre a metade de um caminho com uma velocidade de 120km/h e a outra metade com a velocidade de 80km/h. Qual foi a velocidade média no percurso total?

A velocidade média total pode ser calculada através do cálculo da média harmônica, ou seja:

Vm = 2/(1/120 + 1/80)

Vm = 480/ (2+3)

Vm = 96 km/h

O fato de as velocidades médias resultarem diferentes do esperado pode ser um bom caminho para alertar que, às vezes, fazemos esforços muito grandes para resultados muito pequenos. É o que acontece quando a nossa pressa no trânsito resulta em ganhos de poucos minutos. 

Vale a pena pensar sobre o assunto. 



[1] Físico e Professor.

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