CORRA QUE O FUTURO VEM AÍ

CORRA QUE O FUTURO VEM AÍ

 

José Fernandes de Lima[1]

 

No carnaval de 2018, a Escola de Samba Vila Isabel apresentou o samba enredo “Corra que o futuro vem aí”.  A escola usou esse título para falar das descobertas e das invenções feitas pelo homem ao longo da história. Falou da descoberta da roda, do fogo, da fotografia, do computador e de outras tantas.

O samba pergunta “como será o amanhã?”, e com uma mensagem otimista, segue dizendo:

Quem quer tocar o horizonte

E conhecer o que virá

Mergulhe fundo, o passado é a fonte 

Quem nunca foi, jamais será.......

 

Lá pelas tantas, o samba fala da ciência quando diz: 

Hoje, pensar em ciência

É ter consciência do que está por vir

Então pra que discutir

Corra que o futuro vem aí.

 

O tema trazido pelos compositores André Diniz e Evandro Bocão continua atual e merecedor de uma discussão mais ampla do que aquela que foi realizada naquele período. Pode ser usado para provocar um debate sobre a incerteza dos tempos atuais.  

Podemos começar perguntando o que passa na cabeça do leitor quando ele lê “corra que o futuro vem aí”. Entende que deve ser correr para perto ou para longe do futuro? 

Entende que a mensagem manda correr no mesmo sentido ou no sentido contrário do futuro?

Ao afirmar que o passado é a fonte do futuro e que quem nunca foi, nunca será, o samba sugere uma resposta para as perguntas acima e repete uma mensagem que nos foi ensinada ao longo dos tempos. Aprendemos que o trabalho era a fonte de toda a criação e que o futuro era consequência do trabalho.

Durante muito tempo, a ideia de futuro foi confundida com a ideia de utopia. 

O livro Utopia, escrito por Thomas Morus, no século XVI, desenhou uma sociedade diferente daquela existente e sinalizou para uma sociedade mais justa e igualitária. Uma sociedade na qual todos defendiam o bem comum. Uma sociedade que, não sendo uma coisa palpável, era um objetivo que devia ser buscado. 

Durante muito tempo, depois da publicação desse livro, as pessoas sonharam e trabalharam para construção daquele tipo de sociedade.

Acostumamo-nos com a ideia de que o tempo está do nosso lado e que somos capazes de fazer acontecer o futuro que desejarmos. 

O futuro era, portanto, alguma coisa que deveria ser desejada e aguardada com muita ansiedade. 

Muitas conquistas foram alcançadas, mas outras tantas ficaram abaixo das expectativas. Verificamos que algumas coisas não funcionaram exatamente daquela forma prometida. 

O futuro de cada um de nós depende das nossas decisões, mas depende também das opções que nos são apresentadas. Para a maioria dos trabalhadores nunca foi dada a oportunidade de decidir entre a compra de um iate e uma casa de campo. Para eles, as alternativas oferecidas nunca ultrapassaram a escolha da marca de cerveja ou de margarina. O livre arbítrio parece ser menos verdadeiro do que a imagem que nos foi vendida. 

Muitas pessoas foram excluídas do processo de desenvolvimento. A meritocracia cantada em prosa e verso não se sustentou como verdadeira e a falta de alternativas causou frustrações.

Diante da impossibilidade de fazer acontecer, diante da incerteza e da insegurança as pessoas começaram a desenvolver uma espécie de nostalgia. Começaram a desejar um futuro semelhante ao passado do qual elas lembram. Passaram a desenvolver uma utopia ao contrário. Na cabeça dessas pessoas, o passado leva vantagem por ser conhecido e seguro. Por isso, quando instadas a propor ações para o futuro, propõem retornar ao passado. 

Tendo em vista que nem todas as pessoas têm a mesma expectativa em relação ao futuro e diante da complexidade do momento atual, a afirmação “corra que o futuro vem aí” pode ser interpretada de duas maneiras distintas: correr para embarcar no futuro ou correr para fugir do mesmo. 

Se o indivíduo está convencido que o futuro será pior, tenderá a desejar que ele demore a chegar e correrá no sentido contrário. Se ele acredita que o tempo está do seu lado e que podemos construir um futuro melhor, entenderá a mensagem no sentido de embarcar no rumo do futuro.

Nesse momento, a pandemia parece diminuir sua força e as escolas ensaiam o retorno às aulas. Os professores estão discutindo a construção e implantação de novos currículos. Esse quadro configura um bom momento para investirmos na melhoria da educação. 

Pensar o futuro da educação indica uma crença na existência do futuro e na possibilidade da construção de um futuro melhor para o país.  Pressupõe acreditar na juventude.

Os novos currículos propostos afirmam que as escolas devem ajudar os alunos na definição de seus projetos de vida. 

A definição de um projeto de vida pressupõe a crença no futuro. Por isso, para que os jovens se motivem no sentido da definição desses projetos, é necessário que a sociedade sinalize com a possibilidade de progresso e de melhoria social. 

Para que a educação continue funcionando como um motor do desenvolvimento, faz-se urgente capacitar e apoiar as escolas para que elas possam acompanhar as transformações sociais e tecnológicas que já estão em curso. 

O futuro vem aí. 



[1] Físico e Professor

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