UM EXEMPLO DE ADOÇÃO E DESENVOLVIMENTO DE INOVAÇÃO EDUCACIONAL

UM EXEMPLO DE ADOÇÃO E DESENVOLVIMENTO DE INOVAÇÃO EDUCACIONAL

 

José Fernandes de Lima[1]

 

Alguns pesquisadores afirmam que a melhoria da educação requer a adoção de metodologias diversificadas que contemplem além da modernização do currículo, outras ações capazes de promover a motivação e o interesse dos alunos. Afirmam que a escola precisa fazer sentido para os estudantes e que fazer sentido é ir mais longe do que ser interessante, pois, muitas vezes, no afã de tornar o currículo mais interessante, as escolas terminam deformando o mesmo.

Entendem esses pesquisadores que os resultados gerais da nossa educação continuam fracos e que as políticas exitosas, compostas de boas práticas, têm dificuldades para serem transformadas em políticas públicas. Projetos voluntários interessantes não conseguem ganhar escala.

Por isso, indicam que para avançar, precisamos fazer uso de inovação e criatividade na escola.

 

A inovação na educação é um tópico crucial e em constante evolução. Ela se refere ao desenvolvimento e implantação de novas abordagens, métodos, tecnologias e práticas no campo da educação, visando melhorar a qualidade da aprendizagem e proporcionar resultados mais eficazes. A inovação na educação pode incluir o uso de tecnologias, novas metodologias de ensino e aprendizagem, novas formas de avaliação e outras abordagens que visam melhorar a qualidade da educação.

 

A inovação na educação visa a reavaliar as metodologias pedagógicas para tornar o ensino mais atraente e dinâmico, bem como para aprimorar as capacidades fundamentais dos estudantes. Trata da superação do pensamento de que as instituições de ensino precisam apenas ensinar a teoria, sem considerar outros aspectos essenciais para a formação humana.

 

Existem diversas áreas em que a inovação educacional pode ocorrer.

1 – tecnologia educacional – parte-se do princípio que o uso de tecnologia da informação na sala de aula, como dispositivos móveis, aplicativos, jogos educacionais, plataformas de aprendizagem online e realidade virtual, pode proporcionar novas oportunidades de aprendizagem interativa e personalizadas.

2 – aprendizagem personalizada: nesse caso, a inovação visa adaptar o ensino para atender às necessidades individuais dos alunos. Isso pode ser feito por meio de estratégias como aprendizagens baseadas em projetos, tutoria individualizada, planos de estudo personalizados e avaliação formativa.  

 

Existem várias novas metodologias de ensino que estão sendo utilizadas em escolas e universidades em todo o mundo. Algumas das novas metodologias incluem: 

1 – metodologias ativas: as metodologias ativas consistem em um método de aprendizado que tem o objetivo de tornar os estudantes engajados, interessados e motivados ao longo do ano escolar.

2 – STEM: essa abordagem tem como objetivo incentivar os alunos a desenvolver habilidades em áreas relacionadas à ciência e tecnologia.

3 – teoria das inteligências múltiplas: é uma abordagem que reconhece que os alunos têm diferentes habilidades e estilos de aprendizagem. Essa abordagem incentiva os professores a adaptar sua metodologia de ensino para atender às necessidades individuais dos alunos.

4 – Movimento maker: é uma abordagem que incentiva os alunos a criar coisas com as próprias mãos. Essa abordagem tem como objetivo desenvolver habilidades práticas e criativas nos alunos.

5 – Design Thinking: é uma abordagem que incentiva os alunos a resolver problemas complexos usando uma abordagem centrada no usuário. Essa abordagem tem como objetivo desenvolver habilidades de resolução de problemas nos alunos.

 

Para incentivar a implantação dessas metodologias, as redes de ensino podem desenvolver atividades como as sugeridas a seguir: 

1 – oferecer formação para professores. A rede de ensino pode oferecer formação para professores sobre as novas metodologias de ensino e aplicá-las em sala de aula.

2 – incentivar a colaboração entre professores. A rede de ensino pode incentivar a colaboração entre professores para que eles possam compartilhar ideias e recursos sobre como aplicar as novas metodologias.

3 – fornecer recursos e materiais. A rede de ensino pode fornecer recursos e materiais para ajudar os professores a implementar as novas metodologias de ensino em sala de aula.

4 – incentivar a participação dos alunos. A rede de ensino pode incentivar a participação dos alunos nas novas metodologias de ensino, oferecendo atividades práticas e projetos que ajudem a aplicar o que aprenderam na prática.

 

Esse processo de inovação adquire um significado especial quando é desenvolvido com um objetivo específico de melhoria da aprendizagem ou com o propósito de resolver um problema detectado pela rede de ensino. Por exempla: para diminuir a quantidade de reprovações.

 

A escolha e o uso de determinada metodologia devem levar em conta os fatores que podem levar os alunos a ter sucesso na escola.

 

O debate sobre inovação na escola nos leva a perceber que a inovação destoa da prática comum e necessita de mecanismos para sua aceitação e incorporação no dia a dia da escola e das redes de ensino.

A expressão inovação na escola é muitas vezes confundida com a utilização de tecnologias de informação e comunicação, confundida com o uso de computadores, smartphones, internet e redes sociais. Essa definição restritiva da inovação educacional deixa de fora uma série de mecanismos importantes para melhoria da educação. 

 

Um dos motivos pelos quais as inovações não se tornam universalizadas é porque elas são, na maioria das vezes, aplicadas de forma independente por pequenos grupos, em escolas isoladas, ou são implantadas de cima para baixo, de forma autoritária, ignorando a autonomia das escolas.

 

Para que tenhamos uma política nacional de inovação educacional, a primeira coisa a ser feita é ampliar a compreensão do que pode ser entendido por inovação na educação e modificar o relacionamento dos órgãos centrais com as escolas.

 

Para além do uso de computadores e máquinas sofisticadas, é necessário entender a importância das tecnologias relacionadas com as mudanças comportamentais.

 

Um caminho que tem se mostrado adequado para a introdução de tecnologias educacionais é partir da identificação de um problema ou uma fragilidade da rede de ensino e provocar as escolas para que elas adotem ou desenvolvam suas próprias soluções.

As soluções de maior sucesso podem ser encampadas pela rede de ensino e transformadas em política regular do estado ou do município.

 

Um exemplo exitoso de adoção e desenvolvimento de inovação educacional está sendo praticado no estado de Sergipe. 

O Estado constatou que um percentual significativo dos seus estudantes do ensino fundamental e do ensino médio estão com atraso escolar. Estão na situação que costumamos chamar de defasagem idade-série. Essa defasagem resulta da reprovação e abandono escolar. Os meninos e meninas vão ficando para trás, sem conseguir prosseguir nos estudos. 

 

De acordo com a sistemática adotada pelo INEP, um aluno é considerado em distorção idade – série quando tem uma idade dois anos superior à idade esperada para aquela série. 

Os dados do Censo Escolar 2022 mostraram que o percentual de estudantes dos anos iniciais do ensino fundamental com distorção idade série, em Sergipe, era de 10,6%. Nos anos finais, esse percentual era de 33,8% e no ensino médio, era de 36,8%.

Esses resultados são piores do que as médias nacionais que são, respectivamente, 7,7%, 21,0% e 24,3%.

 

Diante desse problema, o Estado resolveu inovar mediante a adoção de novas metodologias de ensino. Ao invés de investir na aquisição de materiais tecnológicos e equipamentos de informática, o Estado buscou alternativas pela via da mudança pedagógica e da mudança de atitude dos participantes da escola. A Secretaria Estadual de Educação adotou e desenvolveu a tecnologia proposta pelo UNICEF, denominada Trajetória de Sucesso Escolar.

 

A estratégia Trajetória de Sucesso Escolar é uma iniciativa que tem como objetivo apoiar os estados e municípios na definição, implementação e avaliação de políticas e ações de superação do fracasso escolar e enfrentamento da distorção idade-série.

A estratégia envolve quatro etapas: Diagnostico – que consiste na identificação dos dados sobre atraso escolar, da legislação, dos recursos da escola, dos equipamentos etc. Planejamento – elaboração de plano de ação e de proposta pedagógica participativa, flexível e adaptada aos estudantes em distorção idade-série. Desenvolvimento – execução, acompanhamento e avaliação da proposta.

Adesão – engajamento das escolas, dos parceiros, dos estudantes, das famílias e comunidade escolar.

 

A metodologia estimula e orienta as redes e as escolas para a construção de currículos específicos, com caráter de terminalidade e que envolvam a participação de professores e estudantes na sua elaboração.

 

A tecnologia da TSE busca construir uma nova cultura na escola que permita evitar o fracasso escolar. Busca produzir uma cultura em que professores e estudantes são coautores das atividades e, juntos, aprendem e ensinam uns com os outros. A estratégia consiste na montagem de um sistema de monitoramento e avaliação das políticas implementadas e das ações desenvolvidas nas redes e nas escolas.

 

O UNICEF estimula que os estados e municípios implantem propostas pedagógicas específicas para crianças e adolescentes em situação de atraso escolar. Sugere que é preciso considerar, além dos saberes escolares, as experiências socioculturais e os interesses próprios dos estudantes.

Entendendo que os motivos da distorção idade série são diversos, a TSE escolhe atacar o problema curricular. A estratégia parte do princípio de que a adoção de metodologias participativas, flexíveis e adaptadas à participação dos estudantes é um caminho que facilita o sucesso escolar. As estratégias da TSE são flexíveis. As redes de ensino devem fazer as devidas adaptações.

 

Contando com a consultoria da Comunidade Educativa CEDAC, o estado de Sergipe adotou e adaptou a metodologia TSE e construiu um Programa denominado “Programa Sergipe na Idade Certa: PROSIC”.

 

Seguindo o roteiro inicial proposto pelo UNICEF, o Estado convidou as escolas e identificou aquelas que tinham condições de aderir ao projeto. Em seguida, os técnicos da Secretaria realizaram um diagnóstico do número de estudantes em defasagem e das condições de oferta das escolas participantes. Dando prosseguimento, as escolas propuseram uma forma de organização das turmas especiais, identificaram os alunos e selecionaram os professores.

Antes da formação das novas turmas, houve um diálogo com os pais dos alunos selecionados. 

 

Os professores selecionados passaram por um período de formação. Como decorrência dessa formação, o grupo de professores selecionados construiu uma proposta de reconfiguração curricular que passou a ser ofertada para os alunos das turmas especiais. 

Durante o desenvolvimento do projeto, os professores confeccionaram materiais didáticos específicos que estão sendo adotados com relativo sucesso. 

Do ponto de vista burocrático, o projeto foi submetido ao Conselho Estadual de Educação e posteriormente foi regulamentado por meio de um Decreto Estadual. 

Além disso, foi criado um grupo de trabalho, ligado ao Departamento de Educação, para monitorar e avaliar os resultados.

 

De acordo com o Decreto Estadual que regulamentou o programa, a implantação do PROSIC deve cumprir as seguintes etapas:

1 – identificar os alunos que estão defasados e em distorção idade série.

II – criar turmas especiais, oferecer currículo e metodologia diferenciadas que possibilite a motivação desses alunos e a aprendizagem necessária para que eles possam ser promovidos para as séries consideradas regulares para as suas idades. 

 

Para viabilizar esses objetivos, a Secretaria de Educação identificou um grupo de escolas voluntárias, promoveu a formação dos professores, desenhou um currículo alternativo e autorizou as escolas a fazerem rearranjos das suas ofertas de turmas.

As matrículas dos estudantes nas turmas do PROSIC são negociadas previamente com os pais dos estudantes.

O monitoramento inicial realizado mostrou que os resultados são positivos: os professores produziram materiais didáticos específicos e os alunos estão sendo promovidos com bons resultados de aprendizagem. O número de escolas que adotam a tecnologia está aumentando e várias redes municipais estão solicitando ajuda para implantar sistemas semelhantes. 

 

Pode-se, desse modo, afirmar que o PROSIC é uma tecnologia testada e aprovada com capacidade de promover a recuperação dos estudantes em defasagem idade-série. 

 

As avaliações do programa realizadas pela Comunidade Educativa CEDAC e pelo UNICEF mostraram que os procedimentos adotados pela rede no âmbito do PROSIC resultaram na confecção de um algoritmo capaz de organizar as atividades da escola e propiciar aprendizagem significativa com foco na diminuição do fracasso escolar. 

Mostraram também que as atividades do PROSIC sozinhas não são suficientes para interferir no sistema dito regular, que continua produzindo novos fracassos.

 

Por isso, o Programa necessita ser ampliado e agregar um novo eixo de atividades que trate do monitoramento e da diminuição do risco de reprovação e abandono, antes que o fracasso aconteça. As ações desse novo eixo devem ser feitas em tempo real, durante todo o ano letivo, nas turmas chamadas de regulares. 

 

Esse novo eixo deve incorporar as características metodológicas da avaliação formativa, que consistem no desdobramento da avaliação para melhoria da qualidade da educação.

A avaliação formativa é uma abordagem que envolve avaliar o progresso dos alunos ao longo do ano escolar, em vez de apenas no final do ano. Essa abordagem pode ajudar a diminuir a quantidade de reprovação, pois permite que os professores identifiquem problemas mais cedo e possa corrigi-los. 

 

Com a incorporação do novo eixo, a tecnologia adquirirá o potencial de interferir na qualidade geral da educação da rede de ensino. Para isso, basta que o número de escolas participantes do projeto seja ampliado.

 

Um obstáculo para a implantação desse tipo de projeto reside na insegurança gerencial e na falta de políticas educacionais que resultam da excessivamente frequente troca de gestores e equipes técnicas das redes de ensino.

 

Fazer uso de inovação é gerar condições para que se compreenda o problema, utilize metodologia que auxilie na busca de solução, dê autonomia para os gestores escolares e professores criarem seus materiais e, por fim, institucionalizar essas práticas como política. 

 

Se as secretarias de educação envolvidas nesse processo forem capazes de compreender a importância e o papel transformador dessa tecnologia, acreditar na capacidade das escolas e realizar os investimentos adequados, será possível construir uma visão de futuro segundo a qual todas as suas escolas oferecerão educação de qualidade para todos.



[1] Físico, Professor, Presidente da Associação Sergipana de Ciência.

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