SOBRE USURA E JUROS COMPOSTOS

SOBRE USURA E JUROS COMPOSTOS

 

José Fernandes de Lima[1]

 

A imprensa brasileira tem noticiado as reclamações do Presidente da República contra o Banco Central porque este tem mantido as taxas de juros SELIC em níveis muito elevados. A imprensa destaca o aspecto político do debate por entender que o valor da taxa de juros é decisivo para o desempenho econômico e o desenvolvimento do país.  Juros altos dificultam a criação de novos investimentos industriais e pessoais.

 

A cobrança de juros excessivamente altos sobre empréstimos ou outras transações financeiras é chamada de usura. Em muitos países, a usura é considerada ilegal e imoral, pois pode explorar aqueles que são considerados os mais vulneráveis.

Para combater essa prática considerada predatória, os governos estabelecem limites legais para as taxas de juros, como forma de proteger os consumidores.

 

Na Bíblia, o termo usura é usado para se referir a um indivíduo mesquinho, avarento, cheio de ambição, cobiça e ganância. 

 

Se emprestares dinheiro ao meu povo, ao pobre que está contigo, não te haverás com ele como um usurário; não lhe imporeis USURA. Êxodo 22:25

 

Não lhe darás teu dinheiro com USURA, nem darás do teu alimento por interesse. Levítico 25:37

Na idade média, a usura era uma prática proibida, pois acreditava-se que o dinheiro não poderia gerar dinheiro. A cobrança de juros era considerada uma forma de se explorar uma pessoa que estava passando por uma situação difícil.

 

Com a evolução do sistema financeiro, as pessoas passaram a considerar justo que o credor recebesse uma parte dos lucros obtidos com seu empréstimo, sob forma de juros. No final do século XV, surgiram as primeiras tabelas que limitavam os valores cobrados pelos empréstimos.

A partir da definição das tabelas, ficou estabelecida uma distinção entre juros e usura.

Juro era a taxa cobrada dentro dos valores estipulados na tabela definida por lei e usura passou a ser o termo utilizado para se referir a cobrança de taxas superiores ao limite máximo permitido.

 

No Brasil, a Lei no 1521, de 26 de dezembro de 1951 definiu a agiotagem como prática ilegal e crime contra a economia popular.

O artigo 192 da Constituição Federal de 1988 estabeleceu que os juros não poderiam ser superiores a taxa de 12%. Essa determinação foi revogada pela Emenda Constitucional n40, de 2003. 

 

Diante da complexidade dos fatos, é compreensível que algumas pessoas não consigam acompanhar o debate vigente porque não conseguem entender o mecanismo de funcionamento dos juros, porque não sabem como os juros são calculados e sequer aprenderam a distinguir juros simples de compostos.

 

O juro é um tema tratado nas escolas, nas disciplinas de matemática, normalmente no oitavo ano do Ensino Fundamental, logo depois do tema das percentagens.  

De acordo com os livros didáticos, juro é aquele valor que você paga a mais pelo uso de uma determinada quantia que tomou emprestado, por um determinado tempo. Esse acréscimo pode ser calculado apenas uma vez ou pode ser feito sucessivamente.

Quando ele é calculado apenas uma vez, dizemos tratar-se de juros simples, quando é calculado cumulativamente, dizemos tratar-se de juros compostos. 

 

A decisão sobre a taxa de juros depende do que é combinado entre o credor, que pode ser um banco ou um agiota, e o tomador do empréstimo. A definição dos valores leva em consideração o índice de inflação, os riscos do empréstimo e os custos administrativos, dentre outros fatores.

 

Os juros recebem diversas denominações tais como: juros simples, juros compostos, juros SELIC, juros nominais, juros de mora, dentre outros

 

Os juros simples são calculados de uma única vez, pela formula: J=C.i.t, onde j- representa o juro, C é o capital emprestado, i é a taxa percentual e t é o tempo do empréstimo.

Como exemplo, podemos verificar que, se você tomar emprestado uma quantia de R$ 200,00 por um período de um mês, a uma taxa mensal de 6%, no final do mês, você terá que pagar os R$ 200,00 acrescidos dos juros de R$ 12,00, ou seja, terá que pagar um total de R$ 212,00.

 

Nos juros compostos (também chamados juro sobre juro), o valor da dívida é sempre corrigido e a taxa percentual incide sucessivamente sobre o valor. Juros compostos são uma forma de cálculo de juros onde o valor do juro é adicionado ao principal em intervalos regulares de tempo, e os juros subsequentes são calculados com base no saldo restante após cada adição de juros. Esse processo de reinvestimento dos juros leva a um crescimento exponencial do saldo devedor ao longo tempo.

 

A fórmula utilizada para calcular o montante a ser pago no final do período do empréstimo é: M=C(1+ i)^n , onde é o montante a ser pago, C é o capital emprestado, i é a taxa percentual e n é a potência à qual deve ser elevado a valor que se encontra entre parênteses e corresponde ao número de períodos vencidos. 

 

As taxas de juro podem ser estipuladas para o período de um ano ou para períodos menores. É preciso ficar atento porque uma taxa mensal aparentemente pequena pode corresponder a uma taxa anual muito elevada. 

 

Um exemplo muito simples: nos últimos tempos, alguns bancos têm oferecido empréstimos com taxas de juros de 6% ao mês, o que, na opinião deles, é uma pechincha.

O que não está dito e poucas pessoas conseguem perceber é que: com essa taxa, se o leitor tomar R$ 1.000,00 emprestados, no final de um ano, a sua dívida terá duplicado, ou seja, ele deverá a quantia de R$ 2.012,20.

 

O regime de juros compostos é o mais comum no sistema financeiro e o mais útil para o cálculo de problemas do dia a dia. 

Por isso, para além das discussões levantadas pelo Presidente, as taxas de juros estão entre os fatores mais importantes na economia de um país. Os setores produtivos levam em consideração as taxas de juros antes de decidir onde e como aplicar as suas economias.

Se desejarmos preparar os nossos estudantes para o exercício da cidadania, necessitamos ensinar esse assunto com um pouco mais de cuidado.

Será que os novos currículos estão levando esse assunto em consideração?

 

Se, apesar dessas discussões, o leitor continuar indeciso sobre a importância desse tema, sugiro refletir sobre uma frase que é atribuída a Albert Einstein. 

Perguntado sobre a complexidade de seus cálculos, ele respondeu que a conta mais importante que existe é a conta dos juros compostos. “O poder do juro composto é a força mais poderosa da galáxia”.

Estaria ele fazendo uma brincadeira?

 



[1] Físico, Professor, Presidente da Associação Sergipana de Ciência.

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