SOBRE MARÉS

SOBRE MARÉS

 

José Fernandes de Lima[1]

 

Um percentual significativo da população brasileira reside na região litorânea. As pessoas que moram nessas regiões têm suas vidas influenciadas pelas marés. Em determinadas épocas do ano, alguns bairros chegam a ser totalmente alagados.  

 

Apesar dessa influência sobre a vida das pessoas, o tema das marés é pouco destacado nas escolas. Dessa forma, desperdiçamos uma oportunidade de trabalhar com um tema de interesse imediato. Um tema motivador, como tentaremos mostrar nas linhas a seguir. 

 

Os livros de ciência nos ensinam que maré é o fenômeno de subida e descida do nível das águas de uma região que acontece em decorrência dos efeitos gravitacionais criados pela Lua e pelo Sol.

A explicação prossegue afirmando que devido ao fato de a força gravitacional diminuir com o aumento da distância entre os corpos, a região da Terra que estiver voltada para um desses astros (Lua, Sol) sofre uma atração gravitacional maior do que aquela sofrida pela região mais distante. Essas forças desiguais causam acelerações desiguais que acabam deformando temporariamente a distribuição de massas da Terra. 

Devido ao movimento de rotação da Terra, a cada instante, regiões diferentes da Terra estarão submetidas às marés baixas e altas, fazendo com que o fenômeno seja cíclico em cada local.

 

O Sol também causa influência sobre as marés, mas a sua influência é menor devido ao fato dele estar mais longe. A influência da Lua é quase três vezes maior do que a influência do Sol.

Ao ser somada com a influência da Lua, a influência o Sol tem um papel amplificador ou modulador das marés. Quando alinhado com a Lua, nas fases de Lua nova e Lua cheia, ele amplifica o efeito da força gravitacional e o nível das águas aumenta. Nas fases de Lua minguante e Lua crescente, as linhas que unem a Terra à Lua e ao Sol estão a 90º uma da outra e a força de atração do Sol reduz o efeito da força da maré da Lua. 

 

O período durante o qual a maré está subindo é chamado de enchente. O nível da água mais alto é chamado de maré cheia, maré alta ou preamar. O período de decrescimento é conhecido como vazante. Quando o nível das águas atinge seu valor mais baixo, dizemos que ele atingiu a maré baixa. 

 

Em algumas localidades do planeta, o desnível entre a maré alta e a maré baixa pode ultrapassar a altura de 15 metros. No Brasil, as marés mais altas ocorrem no estado do Maranhão, onde pode ultrapassar a casa dos sete metros. 

 

Nesse momento, chegamos num ponto crucial para continuação desse artigo. 

Se o leitor está satisfeito por saber que a maré decorre da atração da Lua sobre as águas da superfície da Terra, eu me vejo na obrigação de alertar para um complicador, que pode acabar com a sua tranquilidade.

 

Lamento informar que o modelo descrito acima não é suficiente para explicar o fato de o ciclo das marés ser composto por duas marés cheias e duas marés baixas a cada dia. Em outras palavras, o intervalo entre duas marés cheias é de aproximadamente 12 horas. 

Se a maré acontecesse apenas no lado da Terra que está voltado para a Lua, o intervalo de tempo entre duas marés altas seria de 24 horas, pois corresponderia ao tempo gasto para uma volta inteira da Terra.

 

Como podemos explicar que a maré aconteça duas vezes por dia?

 

Para que tenhamos duas marés por dia, separadas de um tempo de 12 horas, é necessário que as deformações ocorridas aconteçam simultaneamente em dois pontos opostos da superfície da Terra.  O intervalo de 12 horas só é explicado se admitirmos que ao mesmo tempo que acontece a deformação do lado voltado para a Lua, há também uma deformação do lado diametralmente oposto.  

 

A deformação que ocorre do lado voltado para a Lua já foi explicada pela atração exercida. Porém, para termos uma explicação completa, necessitamos entender como se dá a deformação do lado oposto.  

 

Essa outra deformação pode ser entendida se lembrarmos que o movimento do sistema Terra – Lua se dá na forma de um par de halteres que gira em torno de um ponto chamado de centro de massa do sistema.

O centro de massa do sistema Terra – Lua está localizado na linha imaginária que liga o centro da Terra ao centro da Lua, numa posição mais próxima do centro da Terra do que do centro da Lua.

Ao girar em torno desse ponto, as águas localizadas na superfície mais distante da Lua tendem a se deslocar para fora da superfície, provocando assim o aumento do nível do mar. 

Trata-se de um fenômeno semelhante ao que acontece quando giramos um balde com água e verificamos que a água é empurrada para o fundo do balde. O mesmo efeito que verificamos ao girar uma gangorra e verificar que os objetos sobre ela se deslocam para as suas extremidades. 

 

Com esse acréscimo, o modelo ficou um pouco mais complicado, mas, agora, consegue explicar o fato de termos duas marés altas por dia.

 

Observar o crescimento e a diminuição das marés e lembrar que eles decorrem de um fenômeno complexo que você conhece pode ser gratificante. 

Eis um motivo para que o assunto seja ensinado nas escolas. 

 



[1] Físico, Professor, Presidente da Associação Sergipana de Ciência.

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