SOBRE TRANSPARÊNCIA E INVISIBILIDADE
SOBRE TRANSPARÊNCIA E INVISIBILIDADE
José Fernandes de Lima[1]
As pessoas aprenderam a cobrar dos políticos que eles atuem de forma transparente. Ao desejar transparência, elas estão querendo saber o que se passa no serviço publico, na vida e na obra dos políticos que elas ajudaram a eleger. Trata-se, portanto, de um correto exercício da cidadania.
Dentre as definições trazidas pelos dicionários, uma afirma que transparência é uma particularidade daquilo que não possui duplo sentido, que apresenta clareza. Transparência é o preceito através do qual se impõe à administração pública a prestação de contas de suas ações.
A Lei do Acesso à Transparência diz que o acesso à informação e à transparência na divulgação das atividades contribuem para aumentar a eficiência do poder público, diminuir a corrupção e elevar a participação social. A referida Lei fala da transparência ativa definida como a divulgação de dados por iniciativa do próprio setor público, ou seja, quando são tornadas públicas informações, independentes de requerimento. A transparência passiva é a disponibilização de informações públicas em atendimento à demandas específicas de uma pessoa física ou jurídica.
Nas empresas privadas, a transparência é tratada de uma forma semelhante. Para elas, transparência implica ter uma comunicação aberta e honesta. Acreditam que a gestão transparente facilita o ganho de produtividade. Agir com transparência é deixar sempre claro o que se deseja e pensa.
O trabalhador transparente é aquele que não esconde nada para si, ou seja, compartilha todas as informações que dispõe com os seus colegas de trabalho.
No relacionamento pessoal, a transparência também desempenha um papel fundamental.
Desse modo, quando desejam transparência, as pessoas estão querendo saber o que se passa na vida e na obra dos indivíduos e instituições.
O que elas não se dão conta é que a palavra transparência pode ter outros significados.
A Transparência é também traduzida como a característica daquele objeto que deixa passar a luz e permite que seja visto o que está por trás.
Se considerarmos este último significado, pedir que os políticos sejam transparentes pode não significar que eles fiquem mais visíveis.
Dizemos que um objeto é transparente quando ele nem absorve nem reflete a luz e deixa-a passar livremente.
Nós vemos os objetos porque eles emitem luz própria ou refletem a luz que atinge os nossos olhos.
Quando a luz incide sobre um objeto, podem acontecer três situações distintas:
I – objeto é um corpo negro, absorve toda a luz, nenhuma luz é refletida e temos a sensação de que não há nada naquela região.
II – o objeto é opaco, absorve uma parte da luz e reflete ou espalha o restante da luz. A luz espalhada pelo objeto chega até os nossos olhos e nos informa que ele se encontra naquela região.
III – na terceira situação, o objeto é totalmente transparente e a luz que incide sobre ele passa através do mesmo sem que ocorra o espalhamento que deveria fazer chegar alguma luz até os nossos olhos.
Nesse último caso, não temos como descobrir se o objeto ocupa ou não determinada posição. Em outras palavras, ao ficar mais transparente, o objeto fica menos perceptível pela via ocular. A transparência torna o objeto menos perceptível. Nossa atenção visual se dirige para o que está atrás dele. Ele só não fica totalmente imperceptível por causa dos desvios da luz que acontecem nos contornos.
Para efeito de fiscalização, é bom que a embalagem seja transparente, mas o objeto ser transparente pode não ser legal.
Eis porque é necessário tomar cuidado quando se pede que os políticos sejam transparentes. Eles podem entender de forma equivocada.
A invisibilidade é um tema abordado em vários campos da ciência e da arte.
O livro do escritor britânico H. G. Wells, O Homem Invisível, descreve um personagem que se tornou invisível. O cientista Griffin descobriu uma fórmula para modificar a transparência dos objetos, aplicou em si mesmo e tornou-se invisível. Aquilo que poderia ser um superpoder tornou-se um pesadelo. Griffin perdeu a própria imagem e foi obrigado a andar com o rosto coberto por uma bandagem.
O livro foi transformado em filme, em 1933.
No nosso dia a dia, verificamos outras formas de transparência e invisibilidade. Uma delas afeta as pessoas pobres, moradoras de rua, ou que ocupam posições subalternas.
O compositor Chico Buarque de Holanda trata dessa questão, na música Meu Guri. Fala da pobreza, do abandono paterno, da criminalidade e da invisibilidade das crianças pobres que sequer possuem documentos.
O psicólogo Fernando Braga da Costa vestiu-se de gari e trabalhou durante muito tempo, varrendo as ruas da Universidade de São Paulo, sem ser reconhecido. Na sua dissertação de mestrado, mostrou que, pelo olhar da maioria, os trabalhadores braçais são invisíveis.
Esse tipo de invisibilidade independe das propriedades físicas do observado. Depende da indisposição do observador, quando ele se recusa a encarar o estado de pobreza.
Comentários
Postar um comentário