Brasileira está em ranking da Nature dos dez cientistas que fizeram a diferença no mundo em 2016

Notícia publicada no Jornal da Ciência, em 20 de dezembro de 2016.

1. Brasileira está em ranking da Nature dos dez cientistas que fizeram a diferença no mundo em 2016

“É uma mensagem muito clara de que investir em ciência e em educação é sempre importante e imprescindível para o País”, ressalta Celina Turchi, que liderou os estudos que descobriram a ligação entre zika e microcefalia
A médica especialista em doenças infeciosas Celina Turchi foi considerada pela revista britânica Nature entre os dez cientistas do mundo que fizeram a diferença em 2016. A revista destacou a atuação dela na linha de frente da batalha para entender o mistério da epidemia de microcefalia no Nordeste do Brasil. Em poucos meses, a cientista articulou grupos de pesquisa na região, no resto do País e no mundo todo para buscar respostas. E assim se chegou à ligação inédita entre o vírus zika e a microcefalia.
Em entrevista ao Jornal da Ciência, Turchi destacou que esse reconhecimento comprova que se o País investe em educação e ciência, ele será sempre capaz de responder a emergências como essa. “Acho que para mim essa é uma grande satisfação e até inusitado, mas me parece que é uma mensagem muito clara de que investir em ciência e em educação é sempre importante e imprescindível para o País”, afirmou.
Formada em Medicina pela Universidade Federal da Goiás, mestre em epidemiologia pela London School of Hygiene & Tropical Medicine (no Reino Unido) e doutora pelo Departamento de Medicina Preventiva da USP, a pesquisadora conta que passou a vida acadêmica na Universidade Federal de Goiás, onde foi professora titular, e, após se aposentar, foi convidada para trabalhar como pesquisadora visitante no Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães, da Fiocruz de Pernambuco, em 2014.
Foi nesse Centro de Pesquisa que Turchi organizou o grupo de pesquisa Microcephaly Epidemic Research Group (MERG), formado por pesquisadores de várias instituições, principalmente do Nordeste do Brasil, como a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a Universidade Estadual de Pernambuco (UEP), além do Centro Aggeu Magalhães, o que permitiu que se avançassem rapidamente os testes sorológicos sobre o zika.
“Eu acho que o investimento em pesquisa, em educação, em manter grupos como esse funcionando é imprescindível para que o País possa responder às suas necessidades e, também, que possa fazer frente e estar em dia com a ciência do mundo inteiro”, observou.
Colaboração
Durante toda a conversa com o Jornal da Ciência, Turchi enfatizou várias vezes que os resultados obtidos nesses estudos são frutos da colaboração de vários pesquisadores, desde as primeiras observações clínicas.
“Nós vimos nesse momento de crise que a colaboração entre os pesquisadores era fundamental para que pudéssemos dar uma resposta mais rápida, porque isso implicava na saúde reprodutiva das mulheres e na sobrevivência de todo um grupo de crianças que estava nascendo com grandes déficits neurológicos”, conta.
A epidemia de microcefalia foi detectada em agosto de 2015 por duas neuropediatras de Recife. Visitando diferentes hospitais, Ana Van Der Linden e Vanessa Van Der Linden, mãe e filha, começaram a perceber uma recorrência anormal de crianças com perímetro encefálico muito pequeno. Turchi conta que foram elas as primeiras a dar o alerta à Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco.
A Secretaria, então, se mobilizou para registrar o caso e informar o Ministério da Saúde. “Foi então que, em setembro de 2015, o Ministério solicitou que eu, por estar em Recife, fizesse um relatório da situação”, lembra a pesquisadora.
Ao fazer esse estudo, Turchi notou um aglomerado de casos em diferentes hospitais, em recém-nascidos com fenótipos diferentes. “E nesse momento de crise, que é um momento de epidemia, de muita confusão, de muitas perguntas e nenhuma resposta, vários pesquisadores resolveram formar uma equipe e debruçar em cima de um problema que era importante dar respostas relativamente em curto prazo”.
Um desses pesquisadores foi o professor Carlos Britto, cientista da UFPE e membro do Comitê Técnico de Aboviroses do Ministério da Saúde. Foi ele quem formulou a hipótese de que as arboviroses seriam um novo agente causador da microcefalia, conforme conta Turchi.  Pela ausência de testes e de um sistema de notificação, os casos de zika que ocorreram meses antes na região tinham sido notificados como dengue ou parecidos com dengue. “Então, você vê que não é uma descoberta de uma única pessoa. É um grupo de pessoas. Têm inúmeros outros pesquisadores no País”, comenta a cientista.
“O meu mérito foi reconhecer os grupos que trabalhavam com isso, e tentar articular e montar projetos que a gente pudesse provar essa ligação”, diz.
Segundo ela, no início havia muito descrédito de que não era essa a relação com a epidemia. “Mas faz parte da ciência, precisamos mostrar evidências”. O objetivo do grupo era reunir e apresentar de forma mais rápida possível as provas, “dentro de um contexto de muito caos, muita confusão, muita incerteza e muitas hipóteses também, como vacinas e exposições ambientais”.
A colaboração dos diversos grupos permitiu estabelecer a ligação da microcefalia com o vírus zika, em questão de meses, comenta ela. A revista Nature descreve que agora Turchi e seus colegas são as referências para pesquisadores do mundo todo que trabalham na busca de respostas sobre o zika. “É um reconhecimento que compartilho com meu grupo, um grupo que vem trabalhando junto há 18 meses, incansavelmente. Ano passado, passamos o Natal trabalhando, mas neste ano, podemos brindar com esse evento”.
Daniela Klebis – Jornal da Ciência

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